Salvé Baltazar!
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À medida que os escravos da cidade se organizavam, as batucadas deixaram a areia das muralhas e passaram a ecoar nas "Salas de Nações", organizações que reuniam africanos da mesma origem. Os encontros davam-se a cada domingo e duravam "até ao cair do sol", conta o cronista Agustin Beraza, citado pelo académico Gustavo Goldman no livro "Candombe". Velas, flores e vestimentas ao estilo europeu faziam parte deste ritual presidido por reis e rainhas eleitos entre os escravos.
Nestas
reuniões massivas, recordavam as suas origens, alternando-as com novos
elementos captados no contexto em que viviam. Foi assim que desenvolveram um
complexo sincretismo religioso que misturava Kalunga e Nzambi com figuras
católicas impostas pela Igreja e as suas confrarias. Entre os santos venerados
pelos africanos, um deles sintetizava, mais que nenhum outro, a sua condição: São
Baltazar, o rei-mago negro.
A devoção era frenética. Durante a primeira metade do século XIX, Montevideu habituou-se a acordar especialmente ofegante, sempre que o calendário marcava 6 de Janeiro. A cada dia dos Reis, milhares de africanos invadiam religiosamente as ruas da capital uruguaia em frenética batucada em honra a São Baltazar. O candombe vivia o seu apogeu.
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Só por volta das 14 horas, os africanos tomavam de assalto os
arredores de Montevideu, dando início à verdadeira festa. Ecoavam tambores, "kissanjes,
marimbas, apitos" e "um coro de milhares de vozes descomunais",
conta o Ferro-carril. Todos participavam, "desde os morenos de cem anos
[...] até à negrita pequena ".
Apesar
da força destes festejos, o tempo não corria a favor de São Baltazar. A morte
dos anciãos que chegaram como escravos a Montevideu, e a influência do
crescente "sector negro crioulo", avesso a "coisas de
África", confluiu no fechar de portas das Salas de Nações por finais do
século XIX, conta Gustavo Goldman. Com estas organizações, desapareceram também
os grandes cortejos do dia dos Reis. Nas primeiros décadas do século XX, o
candombe passou a ser uma mero apontamento nos desfiles de carnaval, levado às
rua por grupos chamados "comparsas". Terminava, assim, a era dos Reis
africanos em Montevideu.
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